Toda uma vida dentro do mangue. Essa é a história de dona Terezinha de Jesus, uma senhora de 82 anos, que passou a vida dela catando mariscos em Porto do Mangue. A mulher negra, viúva e mãe de 19 filhos é a protagonista do documentário: Mulheres da Lama, uma produção dos estudantes do curso de Licenciatura Educação do Campo, Francisco Bezerra e Chagas Santos, sob a coordenação do professor Luiz Gomes. O lançamento do filme aconteceu nessa terça-feira, 17, durante a realização do II Seminário Educação do Campo, promovido pela Universidade Federal Rural do Semi-Árido.
Produzido de forma artesanal, o documentário com 30 minutos de duração, surgiu a partir da elaboração de um artigo científico. “Nesse trabalho não damos voz a D. Teresinha, mas ajudamos a gritar”, afirmou o professor da Ledoc, Luiz Gomes. Para o professor, o filme representa na sua simplicidade um rico material didático-pedagógico ao abordar questões como: etnia, gênero e a invisibilidade de pessoas mais simples não reconhecidas pela sociedade.
Para o professor Gomes, discutir educação do campo é extremamente importante no atual momento em que o governo busca alternativas para a consolidação das ações afirmativas. “Precisamos unir forças e encarar o curso com toda seriedade, pois não sei se a universidade abre as portas para as minorias ou se estamos forçando a nossa entrada”, disse, se referindo as ações afirmativas que têm garantido o acesso e a permanência das minorias na universidade. “O curso Educação do Campo traz o comprometimento com a luta dos oprimidos”, reforçou Luiz Gomes.
Para o reitor da Ufersa, professor José de Arimatea de Matos, a implantação do curso Ledoc é fruto a expansão e a interiorização da Ufersa. “O ensino não se restringe apenas ao conhecimento em sala de aula, a Ufersa tem buscado novos aprendizados fora da instituição e esse trabalho é mais um exemplo da participação e do envolvimento dos estudantes e professores com a questão social”, afirmou.
A coordenadora do Departamento de Agrotecnologia e Ciências Sociais, professora Ludimilla Carvalho, a proposta do filme é mais um exemplo concreto de que a universidade compõe um universo de pessoas, conhecimentos e vivências para se construir um novo conhecimento. “Vivenciamos aqui momento de socialização, convívio e partilha num espaço de transformação e libertação”, pontuou. Reforçando as palavras da professora, o coordenador da Ledoc, professor Emenson Medeiros, a licenciatura, apesar de recente, consegue marcar seu espaço dentro da Ufersa, tendo como exemplo, o II Seminário e a boa formação oferecida pela graduação.
Para a professora Ady Canário, da Coordenação Geral de Ações Afirmativas, Diversidade e Inclusão Social – Caadis – a licenciatura Educação do Campo já conta com uma trajetória de conquistas. Segundo Ady, o curso mudou a “cara” da Ufersa oferecendo mais oportunidades às minorias. “Refiro-me não o que somos, mas o que nos tornamos pelo poder transformador da educação”, afirmou. Ainda segundo a professora, a Caadis tem proporcionado à Ufersa implementação de políticas afirmativas com o incremento de ações voltadas para a diversidade, a acessibilidade e as questões de gênero e de etnia.
MULHERES DA LAMA – O filme, traduzido como “um simples olhar”, pelo roteirista Chagas Santos, possibilitou retratar a história de uma marisqueira, personagem da vida real para dentro da universidade. “Esse é o papel da academia na sua atuação de ensino, pesquisa e extensão”, pontuou o aluno. A luta das mulheres marisqueiras deu-se pela necessidade de uma renda extra já que a vida de pescadores é de inúmeras dificuldades.
Aluno do segundo período da Licenciatura Educação do Campo, Francisco Bezerra, idealizador e diretor do filme Mulheres da Lama, não escondeu a emoção ao lançar o documentário. “Uma das coisas que mais sonhei na vida foi entrar na Universidade. Apesar do pouco tempo já são muitas as histórias construídas no ambiente acadêmico”, revelou, confessando “quando se quer construir alvo a vontade é maior que os obstáculos”, se referindo tanto ao acesso e a permanência dele na Universidade, quanto a produção do documentário.
Com apenas um aparelho celular e uma câmera de vídeo já ultrapassada, os dois estudantes partiram para Porto do Mangue, uma busca de captar histórias de vida. “A de dona Terezinha de Jesus é apenas mais uma de tantas existentes na nossa sociedade”, afirmou. Além do filme, a iniciativa rendeu também a produção de um artigo científico aprovado no Seminário Internacional Diálogos com Paulo Freire.
Presente na sessão de estreia, a protagonista do filme Mulheres da Lama, dona Terezinha de Jesus, aprovou e gostou de se ver no filme. “Achei muito bonito”, afirmou. Ela trabalha diariamente no manguezal do Rio das Conchas, no Porto do Mangue, desde 1950, e de lá tira o sustento de toda a família. “Até quando puder trabalhar, eu venho”, afirma a marisqueira que acorda as 3hs da madrugada, atravessa o rio sozinha, remando uma canoa para catar búzios, que é a fonte de renda e de alimento de toda a família. No final da sessão, a protagonista do documentário recebeu das mãos do reitor, professor José de Arimatea e, do diretor do filme Francisco Bezerra, uma comenda relativa ao lançamento da peça audiovisual.